quinta-feira, 14 de maio de 2015

Resenha do livro “O que é Ideologia” de Marilena Chauí

Universidade Federal da Paraíba
Sociologia Jurídica
Sebastião Figueiredo M. Júnior
11.05.2015

   Muito se fala em ideologia, entretanto, escasso é o conhecimento do conceito acadêmico que se atribui à palavra. Marilena Chauí, professora de História da Filosofia e de Filosofia Política da USP, em seu livro “O que é Ideologia”, analisa criticamente a origem e as construções desse conceito ao longo dos séculos. Para tal, Chauí faz um passeio historiográfico a partir da teoria aristotélica das quatro causas, do espírito positivista de Augusto Comte, da neutralidade de Émile Durkheim e do socialismo de Marx e Engels, dentre outros pensadores.
   De início, a autora expõe uma teoria elaborada por Aristóteles a qual propunha explicar  movimento, grande preocupação dos gregos. Batizada pela filosofia medieval, a teoria das quatro causas baseava-se pelas quatro causas do movimento dos corpos: material, formal, motriz e final. No entanto, as quatro causas não tinham um mesmo valor entre si e eram hierarquizadas de acordo com sua posição.  A causa menos valiosa ou menos importante é a causa eficiente (a operação de fazer a causa material receber a causa formal, ou seja, o fabricar natural ou humano) e a causa mais valiosa ou mais importante é a causa final (o motivo ou finalidade da existência de alguma coisa). Em outras palavras, a causa final está vinculada à idéia de uso e este depende da vontade de quem ordena a produção de alguma coisa. A teoria das quatro causas aristotélica não é resultado de investigação neutra e desinteressada, uma pura atividade científica que visa estabelecer como as coisas que existem se comportam, tampouco revelar a natureza dessas coisas, mas sim, fomento para a ordem social grega (e posteriormente medieval) estabelecida à época de Aristóteles: o escravagismo (e o servilismo medieval). Os senhores identificam-se com as causas finais, a mais importante, ao passo que os escravos e servos com as causas motriz e eficiente, assegurando no terreno teórico a superioridade de uns sobre os outros.
   Ainda nas primeiras páginas, Chauí explana sobre o apanhado do século XVII e XVIII da teoria da causalidade. Neste período, trabalhos de Galileu, Francis Bacon e descarte, dentre outros, reduziu as quatro causas apenas a duas: a eficiente e a final. A teoria da casualidade passou, então, a definir-se com apenas “causa e efeito”. Nesse sentido, os corpos humanos são autômatos, governados por leis mecânicas.  O trabalho, ao contrário do que se pensava na fase aristotélica, agora é valorizado. É uma das expressões privilegiadas do homem como ser natural e espiritual. Para a autora, isso é resultado do fruto do pensamento dominante burguês.
     A seguir, Chauí inicia uma definição do termo ideologia. Segundo ela, a expressão foi utilizada pela primeira vez por volta de 1800, pelo Dr. Cabanis, juntamente com Destutt, num livro dá época, tendo com objetivo desenvolver uma nova Ciência: Gênese das idéias. Assim, o papel da teoria é desvendar os processos reais e históricos, apontando tanto os caminhos objetivos que conduzem à exploração e à dominação quanto aqueles que podem conduzir à liberdade. Quer dizer, a teoria tem uma função crítica que lhe é inerente, mas, em si mesma,                                                  não assume valores externos ao processo objetivo.
       Já em 1812, Napoleão atribui um sentido pejorativo à palavra ideologia, no seu discurso onde declarou que “Todas as desgraças que afligem nossa bela França devem ser atribuídos à ideologia, esta tenebrosa metafísica que, buscando com sutilezas as causas primeiras, quer fundar sobre suas bases a legislação dos povos, em vez de adaptar as leis ao conhecimento do coração humano e às lições da história”. Com isso, Napoleão invertia a imagem que os ideólogos tinham de mesmos.
      Na visão positiva de Augusto Comte, ideologia seria sinônimo de teoria. Assim, cada fase do espírito humano o leva a criar um conjunto de idéias para explicar a totalidade dos fenômenos naturais e humanos – essas explicações constituem a ideologia de cada fase. A positivação do conceito de ideologia, segundo a autora, concebe a prática como simples instrumento ou mera técnica que aplica automaticamente regras, normas e princípios vindos da teoria, ou seja, os teóricos comandam e os demais se submetem.  Nesse sentido, quando as ações humanas – individuais e sociais – contradisserem as idéias, serão tidas como desordem, caos, anormalidade e perigo para a sociedade global, pois o grande lema do positivismo é: “Ordem e Progresso”. Não obstante, Durkheim chamará de ideologia todo conhecimento da sociedade que não respeite critérios que garanta a neutralidade do cientista. Afirma a autora que para o sociólogo cientista, o ideológico é um resto, uma sobra de idéias antigas, précientíficas. Durkheim as considera como preconceitos e pré-noções inteiramente subjetivas, individuais, “noções vulgares” ou fantasmas que o pensador acolhe porque fazem parte de toda a tradição social onde está inserido.
   Num terceiro momento, Chaui aponta para a importância de fazer uma exposição resumida da filosofia de Hegel, da qual muito dos ditos “ideólogos” alemães estão imersos (Feuerbach, F. Strauss, Stirner, Bauer etc. etc.) e da qual o próprio Marx faz proveito, transferindo a mesma de seu plano excessivamente ideal para aquele que verdadeiramente lhe interessa, o material. De acordo Chauí, Marx acredita que a ideologia se utiliza de inúmeros meios para alienar o povo, como por exemplo, através do Estado. Para o povo, este seria a representação do interesse geral, mas, na verdade, ele é a expressão das vontades e interesses da classe dominante da sociedade. Outro exemplo de ideologia seria apresentar a sociedade civil como um indivíduo coletivo, pois através disso ocultaria a realidade da sociedade que é comprimida pela luta de classes.
A produção das idéias e as condições sociais e históricas não são separadas por Marx. Ele demonstra, também, que a contradição não é a das idéias, mas sim, contradição entre homens reais em condições históricas e social real chamada luta de classe (na qual acontece há muito tempo no mundo inteiro, causando uma grande disputa entre as pessoas).
       É através das classes sociais que a sociedade civil nega o indivíduo isolado e o indivíduo como membro da família. O trabalho não pago (mais-valia) é a origem do capital. Há uma contradição na medida em que a realidade do capital é a negação do trabalho.
Uma das grandes idéias da ideologia é a da sociedade civil concebida como um indivíduo coletivo, visando ocultar a realidade da sociedade civil que é a luta de classes; a luta de classes é o quotidiano da sociedade civil. O processo no qual as atividades humanas começam a se realizar como se fossem autônomas ou independentes dos homens é chamada de alienação. As idéias aparecem como entidades autônomas descobertas por homens determinados, e não como produtos do pensamento de tais homens.
    A autora afirma que para Marx é de extrema importância que saibamos compreender a história como história dos homens e história da natureza, cujos aspectos são inseparáveis e se condicionam mutuamente, pois juntas essas histórias determinam as condições concretas de nossa existência.
Em seguida, a autora demonstra o conceito de alienação proposto por Marx a partir da filosofia hegeliana. Nele Karl Marx salienta a situação dos proletários em relação aos capitalistas: aqueles que possuíam mão-de-obra e conhecimento sobre a produção dos objetos, ao mesmo tempo não possuíam condições para adquirirem as mercadorias
produzidas por eles próprios e se tornavam assim “subordinados” aos donos dos meios de produção.

  a ideologia durante toda a historia serviu de instrumento de dominação, mascarando a realidade social e ocultando a verdade dos dominados. A ideologia serve para legitimar a dominação econômica, social e política. O seu papel é criar na mente das pessoas uma ideia de que todo fenômeno que acontece no mundo é algo natural e que não existe uma razão lógica para isso.

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